Como a compaixão pode salvar seus relacionamentos desgastados

Quando relacionamentos pessoais e diferenças ideológicas colidem, o resultado pode desgastar a relação, ou até levar a anos de silêncio e distanciamento. A atriz Betty Hart oferece uma alternativa ao tratamento frio e indiferente: a compaixão, e uma chance de crescer e mudar em vez de perder tempo valioso ao lado das pessoas que você ama.

00:09

Eu sou, descaradamente, a filhinha do papai. Meu pai foi o primeiro a dizer que sou linda. Ele sempre dizia que me amava, e era uma das minhas pessoas favoritas no mundo, e por isso foi muito difícil descobrir que tínhamos uma diferença ideológica tão sincera e profunda que nos causou um afastamento de dez anos. Antes de o termo ser cunhado, eu “cancelei” meu pai.

00:54

Nos últimos anos, a cultura do cancelamento ganhou grande proeminência. Ela existiu através do tempo, mas, na sociedade em geral, é quando uma pessoa proeminente diz ou faz algo do qual nós, o povo, discordamos, e nós a tornamos “persona non grata”. É o fim dela. Não deve ser reverenciada. Não deve mais ser parte do nosso mundo. E isso dentro do âmbito público. Hoje vou falar sobre o âmbito particular. Quando cancelamos pessoas em nosso círculo, pessoas em nosso meio, pessoas que nos amam e que amamos, e isso é mutualmente benéfico, mas graças a uma profunda e sincera diferença ideológica, tomamos a decisão de cancelá-las de nossas vidas. Quero sugerir que a cultura do cancelamento precisa mudar e, no lugar dela, precisamos de uma cultura de compaixão.

02:01

Mas antes de começar, vou falar sobre duas premissas que existem quando participamos da cultura do cancelamento. A primeira: temos que acreditar que estamos certos, 100%, sem possibilidade de erro. E segunda: a outra pessoa, a que vamos cancelar, claramente não pode ter habilidade de mudar, crescer ou se desenvolver.

02:30

É óbvio que as duas são problemáticas, porque, às vezes, não estamos certos. Não sei vocês, mas houve momentos em minha vida em que eu soube, sem sombra de dúvida, que estava certa, e descobri que estava errada, muito errada, errei por muito. Então, se aconteceu comigo e talvez com você, talvez possa acontecer com os outros.

02:58

A segunda é um pouco mais desafiadora, porque sei que mudei nos últimos anos. Não mudamos todos? Apesar de as partes centrais da Betty continuarem as mesmas, elementos-chave mudaram drasticamente. A Betty de 8 anos não é a mesma Betty de 18, que não é a mesma de 28, que não é a mesma de 38. Eu mudei. E se sou capaz de mudar, não deveria acreditar que os outros podem fazer o mesmo?

03:35

Então o que devemos fazer? Em vez de cancelar pessoas, deveríamos usar uma ferramenta chamada compaixão. Acho a definição de compaixão fascinante. Não vejo muitas pessoas falando sobre isso. Compaixão significa sofrer com alguém, sofrer junto com a pessoa. Imagine. Quando alguém, digamos, um vovô, fala alguma coisa que te leva a decidir não convidá-lo mais para a Ação de Graças, e se, em vez disso, escolhêssemos sofrer junto com ele? E se decidíssemos que nosso amor é tão grande, tão profundo, tão forte que estamos dispostos a sofrer, até quando pode ser doloroso?

04:30

Agora, sejamos claros. Não estou negando o direito de ninguém de cancelar outra pessoa. O que estou sugerindo é que talvez esse não seja o melhor caminho. Quando pensamos na situação com o vovô na Ação de Graças, se escolhermos cancelá-lo, não estaremos mais próximos a ele. Não apenas deixamos de ouvir o ponto de vista dele, mas também não podemos dividir o nosso. E se nós formos a única pessoa, por causa de nossa profunda conexão, amor e afeto por nosso avô... ou qualquer outra pessoa... e se nós plantarmos as sementes da mudança, sementes de influência, sementes da diferença? Para ser justa, não posso prometer que só por plantar a semente, ela será regada, ela terá sol ou até mesmo um pouco de fertilizante. Mas posso dizer que se você não plantar, quem vai?

05:33

Acho interessante essa ideia de sofrer com alguém. Significa que escolhemos valorizar a totalidade da pessoa em vez de um aspecto particular, como uma estrutura, uma mentalidade ou um sistema de crenças. Escolhemos acreditar que a pessoa inteira é mais valiosa do que as partes individuais.

06:00

Encontrei uma dupla maravilhosa que demonstra isso de forma linda. Talvez você já coheça. Os falecidos juízes, Ruth Bader Ginsburg e Antonin Scalia eram amigos muito, muito próximos, e eram completamente diferentes em termos de sistemas de crenças. Na verdade, Antonin Scalia disse uma vez: “Eu gosto de tudo, menos das ideias dela sobre a lei”. Ele achava que ela estava errada. Ela achava que ele estava errado. Eles não mudaram esse ponto de vista de maneira alguma. Ainda assim, tomavam chá juntos toda semana, e em toda véspera de ano novo, estavam juntos com suas famílias. Passavam férias familiares juntos. Escolheram sofrer juntos, em vez de se cancelarem. O amor e respeito que tinham um pelo outro continuou a crescer, mesmo que nunca tivessem concordado um com o outro.

07:11

Imagino que a curiosidade foi uma parte disso. Se escolhermos ser curiosos sobre o que é diferente, podemos descobrir algo no caminho. Afinal, se somos quem somos por causa de nossas experiências, isso não é verdade também para outra pessoa? Será que já usamos usar essa ferramenta de empatia, de estar na pele de alguém, para realmente descobrir o contexto do porquê acreditam no que acreditam?

07:42

Agora você provavelmente está dizendo: “É. OK, Betty, isso parece bom. Mas e você? Mas e você e seu pai?” É uma pergunta válida. Depois de dez anos sem falar com meu pai, eu liguei para ele certo dia, e disse: “Aposto que se dependesse de você, você provavelmente voltaria no tempo e mudaria algumas coisas. Eu faria isso. Mas já que não podemos, por que não começar de novo?” E ele disse: “Sim, porque eu te amo. Sempre amei, e sempre vou amar”. Sou muito grata por ter ligado, porque não tinha jeito de eu saber que alguns anos depois, meu pai teria Alzheimer. E alguns anos depois disso, ele morreria. Nunca concordamos sobre o que nos separou, nunca. Mas nosso amor continuou. Continuou durante os dez anos em que não conversamos, e continuou seis anos depois.

09:06

Estou encorajando a todos nós a nos tornarmos pessoas que escolhem a compaixão e não o cancelamento. Estou pedindo que considerem que a prática da curiosidade é melhor, que podemos escolher a empatia, que podemos escolher amar tão profunda, abrangente e fortemente que as diferenças não importem. Por que temos tanto medo de diferenças? Também quero que plantemos sementes, sementes de mudança, influência e diversidade. De novo, não posso prometer, nem a você nem a ninguém, que plantar essa semente vai fazer alguma diferença. Mas e se fizer? Sou quem sou por causa de tudo ao que fui exposta. Mudei de ideia com o passar dos anos e cresci por causa de pessoas que plantaram sementes em mim; algumas eu vi, outras não. Então, não seria ótimo se no lugar da cultura do cancelamento, criássemos a cultura da compaixão, onde estejamos dispostos a sofrer junto aos nossos amados, porque os amamos? E não podemos ser uma comunidade que planta sementes? Afinal, se não plantarmos, quem plantará?

10:51

Obrigada.

10:52

(Aplausos)

Previous
Previous

A vida é mais do que ser feliz